Ouvi uma história que provavelmente é falsa, porém, lembrei de outra história igualzinha, porém verdadeira, envolvendo o jogador Cafu e o Mestre Telê Santana.
Primeira história: o Mestre Arqueiro. Um discípulo ocidental foi aprender a arte japonesa do arco e flecha. O seu mestre, cuja filosofia envolvia o Zen, focava não no objetivo (acertar o alvo), porém, no processo (saber corretamente os fundamentos e executar os passos corretos).
Nos primeiros 4 anos de treinamento, o discípulo treinou incessantemente apenas o básico, com alvo a 2 metros de distância.
Impaciente com passos tão lentos, ele reclamou com o Mestre, cuja resposta foi: “O Caminho não pode ser medido. Qual a importância das semanas, meses e anos?”.
Frustrado, o discípulo retrucou: “Quero ver o senhor fazer o que está dizendo”.
Daí, o Mestre fez uma demonstração. Colocou uma venda nos olhos, realizou precisamente o procedimento que ensinara, e atirou, acertando na mosca, uma, duas, três vezes…
Eu pensei comigo. Essa história deve ser falsa. Apenas um conto motivacional qualquer. Porém, de alguma forma, eu já tinha ouvido uma história similar… Foi quando recordei do Mestre Telê.
Telê Santana foi o técnico mais perfeccionista do futebol brasileiro. Insistia em treinar o básico, o be-a-bá: como trocar passes, como cruzar, como chutar. Ele foi o treinador da melhor Seleção Brasileira de todas, a de 1982, que, apesar de não levar a Copa, encantou o mundo.
No início dos anos 90, Telê era treinador do São Paulo Futebol Clube. Como sempre, era obcecado pelo seu trabalho. De manhã, tirava ervas daninhas do campo. Chegou a morar no Centro de Treinamento, sem luxo algum, apenas para se concentrar no seu trabalho.
O jogador Cafu era um jovem promissor. Fisicamente era imbatível. Corria mais do que todos, sem cansar. Porém, seus chutes e cruzamentos eram um fiasco.
Telê segurava o Cafu para treinar depois dos outros. E ele ali ficava, treinando 150 cruzamentos, todos os dias.
“Cafu, você cruza muito mal”.
“Cafu, aprenda a cruzar”.
Um dia, o jogador se encheu das cobranças, e retrucou: “Então faz você”.
Telê mandou Cafu ir para a área. Pegou a bola, e fez o cruzamento, na cabeça do jogador. Uma, duas, três vezes, com perfeição. Os demais jogadores, que assistiram à cena, saíram tirando sarro de Cafu.
O esforço se pagou. O SPFC de Telê Santana foi uma das grandes equipes da história, vencendo duas Libertadores da América e dois Mundiais Interclube, derrotando o Barcelona (que tinha Guardiola como jogador) e o Milan. Tudo isso, jogando bonito.
Cafu tornou-se um dos melhores laterais da história do Brasil. Ele dominou a lateral-direita por 4 Copas do Mundo, sendo o capitão da Seleção de 2002, a do penta.

Seja arco-e-flecha, seja futebol ou qualquer outra profissão, a lição é semelhante. Ao invés de querer impacientemente alcançar o fim, cuide em construir o caminho, com firmeza e dedicação.

Trivia:
O nome de batismo de Cafu é Marcos Evangelista de Morais. O apelido veio em homenagem a Cafuringa, jogador da década de 70.
O grande Johan Cruyff, após a derrota do seu Barcelona do Futebol Total para o SPFC de Telê, teria dito: “Se for para ser atropelado, que seja por uma Ferrari”.
Cafu, o melhor do mundo, coloca o dedo na ferida – 15/01/2020 – UOL Esporte
História Em Três Cores: Telê Santana – SPFC Notícias (spfcnoticias.com)