É possível notar algumas diagonais no desenho – mas não explicar. Este é um dos mistérios levantados por Ulam, na época, e popularizados pelo grande colunista de puzzles Martin Gardner.
Nota aleatória: Stanislaw Ulam foi um dos criadores do método conhecido como Simulação de Monte Carlo, juntamente com John Von Neumann, na época da Segunda Grande Guerra.
No último sábado, a minha filha mais velha fez a prova Canguru de Matemática. Eu não conhecia e achei a iniciativa excelente.
É basicamente uma provinha, tipo uma Olímpiadas de Matemática para jovens do ensino fundamental e médio, feita anualmente.
O site do programa, abaixo, é muito bom, e contém inclusive as provas passadas, para os diversos níveis em que ela é aplicada. Faço questão de divulgar:
Este contém 788 problemas a serem resolvidos, em ordem crescente de dificuldade.
O próximo desafio só é liberado após resolver o atual.
Usuário deve fazer cadastro para acessar, e é gratuito.
Exemplo, essa aqui é a primeira tarefa:
“If we list all the natural numbers below 10 that are multiples of 3 or 5, we get 3, 5, 6 and 9. The sum of these multiples is 23.
Find the sum of all the multiples of 3 or 5 below 1000″
No caso acima, há uma abordagem ingênua (testar todo mundo, força bruta), e também algumas mais elaboradas (testar múltiplos de 3 e 5 e tomar cuidado quando o número é múltiplo de ambos).
Eles pedem para não divulgar soluções, que são como spoilers de filmes, estragam toda a brincadeira.
Tem um fórum de discussão para cada problema, a fim de ajudar quem está com dificuldades.
Qualquer linguagem de programação pode ser utilizada – você só informa a resposta e vê se acertou ou não.
O nome do site é em homenagem ao grande matemático suíço Leonhard Euler, que viveu cerca de 200 anos atrás. Foi o mais prolífico dos matemáticos, escrevendo teoremas variando desde grafos até números complexos. Em um determinado momento de sua vida, Euler perdeu totalmente a visão, porém continuava enxergando com sua mente: ele ditava os teoremas e cálculos de sua cabeça para os auxiliares redigirem artigos.
E haja artigos. Euler tem 850 publicações, compilados em 92 livros!
Quantas cartas consigo empilhar, de modo que a borda das superiores saiam da mesa e elas se sustentem apenas por gravidade? Qual distância máxima consigo chegar?
Este probleminha é relativamente simples, e interessante, por remeter à série harmônica.
Para analisar o raciocínio, deve-se pensar da carta de cima para as cartas de baixo.
Com uma carta, posso colocar o centro de gravidade exatamente na borda da mesa (representada pelo triângulo). Ou seja, ando lateralmente meia carta. Como hipótese, podemos considerar que a carta tem tamanho 2, sendo assim, meia carta tem tamanho 1, para facilitar as contas seguintes.
Com duas cartas, considera-se que o centro de gravidade da primeira carta está exatamente na borda da segunda carta. O ponto de equílibro do centro de gravidade do sistema é dado por pela soma de distâncias* pesos.
Nesse caso: (1-x) P = x*P
-> x = 1/2
Com três cartas e o mesmo raciocínio:
(1-x)* P = x*2*P
-> x = 1/3
Temos um padrão, e para a k-ésima carta: (1-x)* P = x*(k-1)*P
-> x = 1/k
Ou seja, o total que a pilha anda lateralmente é dado exatamente pela série harmônica: 1 + 1/2 + 1/3 + 1/4 + 1/5 + … + 1/k
Sobre a série harmônica, o notável matemático Leonard Euler, no século 18, notou que esta tem uma similaridade enorme com a função logaritmo. Mais formalmente, temos a constante de Euler, dada por:
e
γ≈0.5772156649
Ou seja, a soma da série harmônica e o logaritmo neperiano tendem a uma constante.
Dá para perceber a semelhança entre as séries através da prova da divergência da série harmônica (veja aqui). Para cada avanço adicional na soma da série, é necessária uma quantidade exponencialmente maior de termos (ou seja, para cada metro lateral adicional, é necessária uma quantidade exponencialmente maior de cartas).
Uma curiosidade é que não se sabe até hoje se a constante de Euler é racional ou irracional.
Bom, respondendo à pergunta do problema. A série harmônica diverge, ainda que muito lentamente, de modo que a pilha pode andar na lateral uma distância infinita! É claro que, para isso, será necessária uma quantidade infinita também de cartas. Nada mau, para uma pergunta tão ingênua!
Como um amor não correspondido pode influenciar num dos teoremas mais famosos da matemática?
O alemão Paul Wolfskehl, descendente de um banqueiro, era médico de formação, porém, também estudou matemática nas universidades de Bonn e Bern, em torno de 1880.
Nessa época, ele estava terrivelmente apaixonado por uma jovem moça do seu círculo social. Contudo, já desde esta época, jovens nerds não atraíam moças formosas. Após inúmeros “foras”, ele tinha perdido totalmente as esperanças de um casamento, e também a motivação de viver…
Decidido, Wolfskehl planejou cuidadosamente o seu suícidio. Marcou data e hora exatas, testamento feito e todos outros procedimentos completos para o ritual.
Entretanto, ele tinha sido eficiente demais, e ainda faltavam várias horas para o momento previsto. Para matar o tempo, ele decidiu estudar sobre um curioso teorema que tinha acabado de ser provado.
Este era o último teorema de Pierre de Fermat, que estava fascinando matemáticos desde sua formulação, em meados de 1600.
O grande Teorema de Fermat afirma que não existem números inteiros a, b e c, para n>2, tais que:
a^n + b^n = c^n
Para n = 2, este se reduz ao famoso Teorema de Pitágoras, que todos nós estudamos no primeiro grau.
Na época de Wolfskehl, acreditava-se que o teorema tinha sido provado, pelo matemático Augustin Cauchy. Um teorema resolvido não apresenta um desafio. São os desafios das conjecturas não resolvidas que movem os matemáticos, como se fosse uma corrida do primeiro ao chegar ao topo do Everest ou ao Pólo Sul.
Na fatídica madrugada de seu suicídio, Wolfskehl passou horas concentrado, e descobriu um erro lógico na formulação de Cauchy. Com isso, o Teorema de Fermat continuava de pé!
Melhor ainda, quando Wolfskehl completou o raciocínio, o horário do suicídio já tinha passado.
Motivado pela deusa da Matemática, infinitamente mais bela do que qualquer contrapartida feminina, Wolfskehl decidiu continuar a viver.
Para a tristeza de seus parentes e de seu mordomo, Wolfskel tinha outros planos para o seu testamento. Agora, ele oferecia um prêmio de 100 mil marcos (equivalente a 1 milhão de libras em dinheiro atual), para quem decifrasse o Último Teorema de Fermat.
A notícia de que o teorema continuava não resolvido e o prêmio oferecido ajudaram a aumentar o interesse no tema, nas décadas seguintes.
O Último Teorema de Fermat foi finalmente provado cerca de 100 depois, por Andrew Wiles.
Essa história curiosa foi publicada no livro “O último teorema de Fermat”, por Simon Singh, recontada aqui com alguma simplificação aqui, algum exagero acolá.
A expressão a seguir fornece uma aproximação da raiz (a + b), quando b<<a (b muito menor que a):
Dá para interpretar facilmente a aproximação, pensando em áreas.
A raiz quadrada de a é o lado do quadrado que tem área a.
Suponha que queremos a raiz de a + b, e o quadrado a seguir tenha exatamente as dimensões desejadas.
Como fazer para encontrar o valor desconhecido x?
Se a área verde é igual a b, metade dela será b/2, e essa área é aproximadamente igual a raiz(a) * x, desprezando a “quina” que não faz parte do retângulo.
Assim, temos x = b/(2*raiz(a)), e a dedução da fórmula citada.
Note que o erro equivale à parte em vermelho do diagrama.
E o erro será menor tanto quanto b for menor do que a.
Aproveitando a onda das Olimpíadas, aproveito para divulgar que também fui medalha de bronze. Foi nas Olimpíadas Brasileiras de Matemática de 1997.
O livro acima é da SBM (Sociedade Brasileira de Matemática), e contém enunciados e resoluções de provas antigas da OBM. Além disso, no final do livro, tem uma listagem com os premiados de cada olimpíada da coletânea – e confesso que comprei o livro só para ver se meu nome estava lá!
Para estudar para esta prova, em 1997, um livro que ajudou muito foi o Olimpíadas Brasileiras de Matemática, de 1o a 8o (ou seja, a primeira versão da coletânea). Naquela época pré-internet era bem difícil encontrar material bom, no nível alto desse tipo de prova.
Hoje em dia, é bem mais simples. Para quem gosta de matemática, a loja da SBM é um prato cheio.
Outra recomendação de livro de matemática é o abaixo: 12 na matemática e na vida. Conta algumas histórias sobre números e matemática, de forma simples e didática.
O motivo da recomendação é que o autor, Sinésio, é amigo e colega de empresa meu.
Este livro foi publicado há anos atrás e só é possível encontrar em sebos.
Você precisa fazer login para comentar.