Há diversas similaridades entre computação e biologia. Uma dessas similaridades acontece com as formas de memória utilizadas.
Memórias de computador
Computadores têm dois tipos de memória. Uma com velocidade de processamento extremamente rápida mas capacidade de armazenamento limitada, a memória RAM. A outra, com velocidade de acesso baixa mas capacidade gigantesca, que é o disco rígido do computador.
Quando o computador vai processar alguma coisa, utiliza a memória rápida, faz todo o processamento necessário e grava/lê os resultados na memória devagar.
A memória rápida é muito cara, em termos de US$/megabyte, portanto ela deve ser grande o suficiente para o processamento, mas muito menor que a memória devagar. Já a memória devagar é barata, portanto dá para ter gigabytes dela.
É mais ou menos que nem a mesa de trabalho e um armário de arquivo. Pego do arquivo tudo o que preciso, e deixo na minha mesa. Faço o meu trabalho na mesa e depois devolvo tudo certinho ao armário.
Memórias do cérebro
O cérebro humano também tem uma memória rápida e outra devagar. A lógica é exatamente a mesma do computador. A memória de trabalho é limitada e gasta uma enorme energia, além de esquecer facilmente a informação. Já a memória de longo prazo não esquece tão fácil assim, mas demora bastante para gravar alguma coisa nesta memória.
Quando a gente aprende alguma coisa nova, quem trabalha é a memória rápida. Na primeira vez em que se dirige um carro, a pessoa presta muita atenção em tudo. Lembro que eu tinha que ver onde estava o câmbio, todas as vezes em que trocava de marcha. Depois que o conhecimento é assimilado, o esforço de dirigir diminui bastante, vira algo automático: o conhecimento foi para a memória devagar.
Falar em outra língua, em outro país, também é uma atividade bem difícil e exaustiva no começo. Isto porque a memória rápida tem que se concentrar bastante. Depois de um tempo, a pessoa se acostuma, ou seja, o aprendizado vai para a memória devagar.
Memória virtual
O computador usa uma malandragem, que é a memória virtual. Quando a memória RAM acaba, o processador pode pegar um pouco da memória do hard disk emprestada temporariamente. O desempenho do processamento vai diminuir um pouco, mas há o aumento do limite de informação a ser manipulada.
Até aí, eu já sabia. Mas o que eu não sabia era que o ser humano também conseguia fazer isso: pegar emprestado um pouco de sua memória de longo prazo para usar na memória rápida.
Rüdiger Gamm é um cara normal, e era péssimo em matemática. E ele foi treinado em dividir números primos até a 60a casa decimal, raízes quínticas, etc, tudo de cabeça. Como ele conseguia?
Um escaneamento do seu cérebro mostrou que ele estava usando áreas da memória de longo prazo para conseguir estender a sua memória comum.
http://archive.wired.com/wired/archive/11.12/genius_pr.html
Memorização
Há diversas técnicas de memorização poderosas. Por exemplo, uma delas é associar uma lista de palavras que a pessoa quer decorar com algum lugar físico, e criar uma historinha. Ou associar números de 1 a 99 com pessoas, e números com mais dígitos são uma combinação das pessoas representadas pelos números até 99.
Mais ou menos assim:
Decore um número de telefone: (32) 94366-2342
Decore uma historinha: o Bozo subiu em um poste e comeu bife de cavalo com o Silvio Santos, depois beijou a Debora Secco.
É muito mais fácil decorar a historinha, não? O truque é treinar para codificar/decodificar a historinha para os números.
Virando historinha, a gente acessa outras funções do cérebro: criatividade, empatia com os personagens, visualização, etc. E estamos usando outras partes da memória.
Matrix
No filme Matrix 2, tem uma cena em que a Trinity tem que fugir de moto. Mas ela não sabe dirigir. Então, ela downloada a capacidade de dirigir, instala na sua cabeça, e aprende a pilotar a moto em segundos. É no minuto 1:20 do vídeo a seguir.
Será que um dia chegaremos neste nível?
Arnaldo Gunzi
Ago 2015