O estilo Zeca Pagodinho de gerenciamento é o “deixa a vida me levar, vida leva eu”. Se tudo der certo, fico feliz. Se der errado, não ligo. Estou à deriva, leve, flutuando ao sabor do destino. Aliás, a música é um sambinha agradável, simples e cheio de ritmo.
“Sou feliz e agradeço por tudo que Deus me deu”.
O estilo Michael Porter de administração é o oposto: Criar o próprio caminho. Ser o dono do seu futuro. Ter um planejamento estratégico para saber exatamente onde chegar daqui a 10 anos. Estabelecer metas duras de longo e curto prazo. Ter disciplina pesada para cumprir uma rotina que leve ao destino desejado. Ser o timoneiro do seu navio. Conduzir a própria vida, danem-se os deuses e o destino.
O problema do segundo método é que a vida não necessariamente vai colaborar. Mesmo fazendo tudo certo, planos não serão seguidos e metas não serão atingidas. O universo às vezes conspira a favor, às vezes conspira contra… na verdade, o universo não está dando a mínima bola para mim.
O que você vai ser quando crescer?
A frase mais ouvida por toda criança é “O que você vai ser quando crescer?”
Peter Drucker, o grande mestre da administração, dizia: Estou com mais de 60 anos, e ainda não sei o que vou ser quando crescer.
Eu também não tenho a menor ideia do que estarei fazendo daqui a 10 anos e nem do que vou ser quando crescer.
Em um futuro não tão distante, talvez uma guerra mundial perturbe todo o equilíbrio atual. Talvez eu ganhe na loteria. Talvez uma nova doença nos obrigue a mudar de estado. Talvez o futuro seja muito feliz. Talvez nada mude. Talvez eu nem esteja vivo…
O Destino é sempre muitas ordens de grandeza maior do que as minhas forças.
O barquinho a deslizar, no macio azul do mar
É como se estivéssemos em alto-mar, dentro de um barquinho.
Alguns barquinhos são maiores, outros são minúsculos. Alguns têm vela, remos, boia salva-vidas. Outros, têm nada.
Com a nossa força minúscula a movimentar os remos, e nosso know-how de como navegar com a vela, damos alguma direção ao barquinho. Nos casos em que o mar permite e temos sucesso, ficamos tão orgulhosos: “Viram? Consigo domar os mares e ser dono do meu próprio caminho”.
Entretanto, o mar salgado é muito mais poderoso do que nós.
Os gregos antigos oravam a Posseidon (Netuno, para os romanos), deus dos mares, para chegar ao seu destino.
Estes povos antigos atribuíam tudo o que fosse além de nossa força aos deuses. Se tivessem êxito, era porque Posseidon permitiu a navegação nos mares, Atena ajudou a ler as estrelas, e Zeus não atrapalhou. Nunca era apenas a força humana.
Coitado de quem desafiasse os deuses, como fez Ulisses, na Odisseia. Ele desrespeitou Posseidon, ao cegar o único olho e zombar do Cíclope Polifemo, filho do deus dos mares. Por isso, o heroi grego pagou muito caro: demorou 10 anos e percorreu uma jornada árdua para retornar à sua casa.
Enquanto Zeca Pagodinho flutua pelos mares, Michael Porter tenta impor sua vontade sobre o mesmo.
Navegadores antigos tinham frase gloriosa: “Navegar é preciso, viver não é preciso”. Fernando Pessoa.
Vida leva eu
A conclusão é a de que Zeca Pagodinho estava certo.
Temos que batalhar muito para percorrer o nosso caminho.
Entretanto, temos que ter a humildade de nos curvar aos caprichos do Destino. Talvez as correntezas estejam atrapalhando. Talvez a jornada seja um passeio agradável. Nunca se sabe o que virá. Vida leva eu.
Se tudo der certo, fico feliz. Se der errado, não ligo. Sou feliz e agradeço por tudo o que tenho.
Se não tenho tudo que preciso, com o que tenho, vivo. De mansinho lá vou eu.
Bônus. O Barquinho.
Dia de luz, festa de sol
Um barquinho a deslizar no macio azul do mar
Tudo é verão, amor se faz
Num barquinho pelo mar que desliza sem parar
Sem intenção, nossa canção
Vai saindo deste mar e o sol
O barquinho vai, a tardinha cai…
O Barquinho – Maysa Matarazzo.
Composição: Roberto Menescal / Ronaldo Bôscoli