Seria possível eliminar os ideogramas na China e no Japão?

(Baseado numa conversa com o Marcos Melo e depois de anos estudando essas línguas)

As línguas japonesa e chinesa são famosas pelos complicados ideogramas utilizados.

Na China, são chamados Hanzi:

English translation of 中国 ( Zhongguo / Zhōngguó ) - China in Chinese

No Japão, são chamados Kanji.

Japan | kanji symbol

Uma explicação para o surgimento desses ideogramas é que evoluíram da padronização de desenhos.

Digamos, este é o ideograma de rio:

River | kanji symbol

Este é de montanha:

The Kanji Symbol for Mounain

São formas que lembram vagamente o desenho dos substantivos em questão.

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Ideogramas de montanha, rio, árvore e Sol, na ordem.

Entretanto, nem todos os ideogramas são assim tão fáceis.

As ideias mais abstratas são montadas sobre composições de ideogramas simples. Por exemplo, amor, é um desenho composto que não remete diretamente a um desenho de um coração.

Matriz de bordado - Amor- Kanji no Elo7 | Rei Sol Bordados (AE7483)

O problema é que o número desses ideogramas é de enlouquecer. Na China, são uns 15 mil ideogramas, e no Japão, no mínimo uns 5 mil.

No ocidente, o alfabeto tem 26 letras. Faz uma diferença absurda. Em poucos meses, é possível alfabetizar uma pessoa no ocidente, já nos países citados, são necessários anos a fio decorando e utilizando os ideogramas.

A pergunta: é possível eliminar os ideogramas, utilizando apenas o alfabeto ocidental ou alguma alternativa simples?

Uma primeira resposta é que sim, há simplificações desses ideogramas hard.

Em japonês, há o hiragana e o katakana.

As diferenças entre Hiragana, Katakana, Kanji

Em chinês, a versão soft é o pin yin, ou seja, utilizar o alfabeto ocidental para descrever o fonema. 

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Um dos problemas é que a versão soft, digamos 100% pin yin, causa infinita ambiguidade.

O chinês é muito compacto, com poucas palavras dizendo muito. 

Ma pode significar mãe, cavalo, interrogação e mais uns 10 significados. A pronúncia diferencia alguns desses significados, porém, mesmo para a mesma pronúncia, há vários significados.

E é igual para vários outros hanzi. Tipo, shi, tem uns 20 hanzi para a mesma pronúncia. 

Na linguagem falada, o ser humano dá um jeito de se entender. Na língua escrita, não.

Imagine que usar hanzi é uma visão em 3d do mundo. Quando você usa 100% pin yin, você vê apenas uma dimensão. Há perda de informação.

Ou você reestrutura a língua inteira ou utiliza hanzi. Seria catastrófico simplesmente abolir o hanzi.

O kanji segue a mesma lógica – os kanji dizem infinitamente mais do que os hiragana e katakana sozinhos.

Uma historinha. Quando eu era criança, vi em algum lugar a palavra “Shinobi”. Perguntei para o meu pai, fluente em japonês, o que significava “Shinobi”. Ele respondeu: “não sei, tem que olhar o kanji”. Eu não entendi nada, porque no alfabeto ocidental, toda a informação está contida dentro da própria palavra. A explicação foi dada acima: “shinobi” sozinho pode ter inúmeros significados.


Escrever em ossos e concisão da linguagem

Não dá para entender essa explicação pelos parâmetros ocidentais que temos. Temos que entender todo o contexto. Por exemplo, a língua é compacta exatamente por ser difícil de escrever.

Os hanzi são todos curtos, monossilábicos: shi, ma, er, yi, e assim por diante.

Chinese Characters, Oracle Bones, and Calligraphy · Writing ...

A civilização chinesa é antiga. Imagine escrever um hanzi num pedaço de osso, numa pedra ou num casco de tartaruga, por exemplo. A Arte da Guerra, de Sun Tzu, foi escrita em tiras de bambu, depois costuradas para formar um livro.

A bamboo version of 'The Art of War' (composed late 6th century ...

Portanto, não dava para ser prolixo. Um único caractere é difícil de escrever e tem que transmitir a maior quantidade de informação possível. Já na língua ocidental, como é barato escrever os caracteres, é mais barato escrever palavras como “interessantissimamente”. 

(O Marcos Melo contesta essa versão. A língua falada vem antes da escrita, e é a escrita que se adapta. Talvez seja uma convergência dessas duas coisas.)

O caso do Japão é muito mais evidente. A linguagem oral veio desde a origem das pessoas, e os ideogramas foram copiados da China muito tempo depois (uns 500 dC). Por isso, cada kanji tem duas ou mais pronúncias: a pronúncia japonesa original, a pronúncia chinesa, e pronúncias alternativas – e o hiragana e katakana complementam tempos verbais, sufixos, etc…

Japanese Calligraphy Of Tonkatsu Stock Illustration - Illustration ...

Um exemplo. O kanji acima, de “carne de porco”, pode ser lido como “ton” (tonkatsu). Mas também pode ser lido como “buta” (porco).

Das digressões acima, o que realmente aconteceu de verdade não sei e provavelmente nunca saberemos.

Veja também:

https://ideiasesquecidas.com/2019/07/27/recomendacoes-de-livros-sobre-a-cultura-e-historia-da-china/

https://ideiasesquecidas.com/2015/10/31/os-japoneses-originais/

Macarrão com feijão

5 comentários sobre “Seria possível eliminar os ideogramas na China e no Japão?

  1. Siceramante, acho um grande equívoco achar que não dá para escrever em japonês sem os kanjis, eles já possuem o hiragana e o katakana e ainda precisam de um terceiro sistema de escrita para expressar a sua língua? Isso que é ser ineficiente! Ora, basta fazer com que o hiragana represente as principais classes gramaticais; substantivos, verbos, adjetivos, pronomes, etc, e os katakanas represetem partículas, onomatopeias, palavras estrangeiras e nomes próprios de pessoas e lugares, além de fazer uma devida separação entre as palavras, fácil.

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